quinta-feira, 19 de maio de 2016

A importância da razão e a criação de dogmas e seres inquestionáveis no movimento espírita


         
"Essa a base em que nos apoiamos, quando formulamos um princípio da doutrina. Não é porque esteja de acordo com as nossas ideias que o temos por verdadeiro. Não nos arvoramos, absolutamente, em árbitro supremo da verdade e a ninguém dizemos: “Crede em tal coisa, porque somos nós que vo-lo dizemos.” A nossa opinião não passa, aos nossos próprios olhos, de uma opinião pessoal, que pode ser verdadeira ou falsa, visto não nos considerarmos mais infalível do que qualquer outro."


              Inicialmente, diz-se que através desse texto não pretende-se diminuir Espíritos (encarnados e desencarnados) que contribuíram e ainda contribuem positivamente para uma sociedade melhor, mais justa, mais caridosa e solidária.

            A questão é que os fatos nele relacionados, ao nosso ver, atravancam a marcha da Doutrina Espírita, e a fazem caminhar a passos mais lentos do que pode, gerando confusão e auxiliando que surjam pessoas que aceitam qualquer coisa, só por que veio através de um nome consagrado, não analisando frente a frente com o egrégio codificador, e  impedindo que O Consolador se expanda e, portanto, console mais Espíritos, por falta de base racional e coerência, sendo que em sua origem e formulação, a ciência espírita não padece de tais falhas.

         "O médium X ou o orador Y falou". Tudo bem, grandes nomes. Mas e se o que eles disserem, escreverem ou psicografarem for contrário à Kardec, vamos fingir que não aconteceu, com medo de cometer alguma "heresia", de um julgamento, olhares que condenam ou mesmo reações como se fosse o maior absurdo do mundo contestá-los? Quem é o parâmetro de comparação?

            A título de exemplo, trazemos dois:

         Primeiro, veja-se a pergunta 723 de O Livro dos Espíritos, referente à alimentação carnívora:

"A alimentação animal é, com relação ao homem, contrária à Lei da Natureza?
“Dada a vossa constituição física, a carne alimenta a carne, do contrário o homem se debilita. A lei de conservação lhe prescreve, como um dever, que mantenha suas forças e sua saúde, para cumprir a lei do trabalho. Ele, pois, tem que se alimentar conforme o reclame a sua organização.”"[1]

          Segue, sobre o mesmo assunto, a pergunta e resposta 129 do livro O Consolador, de Emmanuel:

"129 –É um erro alimentar-se o homem com a carne dos irracionais?
-A ingestão das vísceras dos animais é um erro de enormes conseqüências, do qual derivaram numerosos vícios da nutrição humana. É de lastimar semelhante situação, mesmo porque, se o estado de materialidade da criatura exige a cooperação de determinadas vitaminas, esses valores nutritivos podem ser encontrados nos produtos de origem vegetal, sem a necessidade absoluta dos matadouros e frigoríficos.
      Temos de considerar, porém, a máquina econômica do interesse e da harmonia coletiva, na qual tantos operários fabricam o seu pão cotidiano. Suas peças não podem ser destruídas de um dia para o outro, sem perigos graves. Consolemo-nos com a visão do porvir, sendo justo trabalharmos, dedicadamente, pelo advento dos tempos novos em que os homens terrestres poderão dispensar da alimentação os despojos sangrentos de seus irmãos inferiores."[2]

          Como segundo, vem algo que é propagado ardentemente na filosofia espírita, que é o fato de ela ser ou não religião. Não vamos nos estender aqui, pois a resposta pode ser afirmativa ou negativa, devendo quem pergunta, antes responder o que é religião para ela. No tocante a isso, com longas, diretas e contundentes, kardecianas explicações, sobre quando se pode dizer que é e quando não é, o estudioso Cosme Massi já o fez brilhantemente.[3]

            Entendemos a necessidade que vários podem ter de se manter em certas posturas, e que causa desconforto "quebrar" certos conceitos que lhe fazem bem, mas isso não pode evitar que apontem-se contradições, muitas vezes claras, em relação ao Espiritismo, e permitir que se espalhem ideias que definitivamente não se coadunam com o que Allan Kardec e os Espíritos superiores elaboraram. A pureza doutrinária não é o engessamento, sobre o qual já foi discorrido em duas oportunidades anteriores, mas sim evitar que se criem conceitos, digam coisas e adotem-se práticas que são contrárias à ciência espírita, modificando-a e fugindo do que ela é e de suas bases (como o desaconselhamento de evocações, por exemplo).

         Apontar erros, de forma fundamentada, nas obras de Chico ou de outro renomado trabalhador espírita  é ofender alguém? Argumentar isso, quando são usados, em reuniões públicas de estudos, é desrespeitar quem o os usa? Seus trabalhos, sejam mediúnicos, sejam de outras formas, como a caridade, falam por eles, mas eles não estão imunes a falhas.

       Não nos tornemos "espíritas exaltados", conforme o codificador elenca no capítulo "Do método" de "O Livro dos Médiuns" (no qual ele fala de como deve ser o ensino da Doutrina Espírita):

"Em Espiritismo, infunde confiança demasiado cega e frequentemente pueril no tocante ao mundo invisível, e leva a aceitar-se, com extrema facilidade e sem verificação, aquilo cujo absurdo ou impossibilidade a reflexão e o exame demonstrariam.(...)"[5] (grifo nosso).

        Ainda, vejamos o conselho de São Luís, no item 266, também de "O Livro dos Médiuns":

“(...)qualquer que seja a confiança legítima que vos inspirem os Espíritos que presidem aos vossos trabalhos, uma recomendação há que nunca será demais repetir e que deveríeis ter presente sempre na vossa  lembrança, quando vos entregais aos vossos estudos: é a de pesar e meditar, é a de submeter ao cadinho da razão mais severa todas as comunicações que receberdes; é a de não deixardes de pedir as explicações necessárias a formardes opinião segura, desde que um ponto vos pareça suspeito, duvidoso ou obscuro.”[6] (grifo nosso)

       Ignorando essas instruções deixadas nas próprias obras fundamentais, mesmo sem perceber, criam-se verdades incontestáveis, dogmas, na acepção usual do termo, detentores com poder, que eles nunca pediram, de dizer o que é ou não Espiritismo; pilares, que eles nunca alegaram ser, dos quais tudo o que vem não pode ser singelamente tocado, discutido, analisado ou contrariado, devendo ser aceito não por que faz sentido, por que passou pelo crivo da razão, mas por que foi ele ou ela quem disse, sob a consequência de quem agir de modo diferente gerar celeuma e tocar em suscetibilidades, as quais os próprios autores das falas ou escritos provavelmente não tem em suas personalidades. 

         Muito cuidado ao eleger seres infalíveis, e dar a eles poderes e qualidades que eles não pediram nem dizem ter. Perfeito só passou um na Terra.

            Tudo isso leva a um próximo tópico, qual seja, o estudo. Para acontecer o que foi falado acima, necessariamente deve haver um desconhecimento de Kardec. Quantos sabem que ele deixou 32 publicações, e não somente o pentateuco e Obras Póstumas, que foi publicado mais de 20 anos após seu desencarne? Quantos sabem que, só em livros, são 22? Quem já leu os 5 "básicos"?  Quem já procurou pela Revista Espírita, que é fundamental para uma compreensão mais aprofundada da ciência espírita e do próprio Allan Kardec? Quantas vezes a argumentação é baseada puramente alhures, deixando o codificador de lado?

              Frente a essa situação, são colocadas mais perguntas: há uma falta de vontade em estudar, ou simplesmente o costume de debater, de expor suas ideias se tornou algo a ser temido? O medo de que o que se irá falar parecer impróprio, impertinente, ou de um nível inferior ao que a reunião ou os encarnados presentes supostamente teriam, podem barrar a espontaneidade, mas isso não deve servir de obstáculo. Colocar sua opinião de forma fraterna é algo a ser levado em alta conta, pois contribui para o crescimento, seja de si próprio, seja de outrem.

            Vale ressaltar que os debates devem seguir a conduta do amor e respeito pelo próximo, jamais deixando que uma opinião seja uma imposição, e a discussão saudável se torne competição pela verdade ou disputa de egos. A conversa amigável, e com a finalidade de aprender, deve sempre ser pautada nos bons sentimentos e intenções, fortalecendo as convicções e mantendo o ambiente, físico e psíquico, harmônicos.

            Por fim, e sempre, é de alta valia rememorar o exemplo de humildade dado pelo próprio Allan Kardec:

"Essa a base em que nos apoiamos, quando formulamos um princípio da doutrina. Não é porque esteja de acordo com as nossas ideias que o temos por verdadeiro. Não nos arvoramos, absolutamente, em árbitro supremo da verdade e a ninguém dizemos: “Crede em tal coisa, porque somos nós que vo-lo dizemos.” A nossa opinião não passa, aos nossos próprios olhos, de uma opinião pessoal, que pode ser verdadeira ou falsa, visto não nos considerarmos mais infalível do que qualquer outro."[7]



Referências:

[1] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 93ª Edição, Brasília (2013).
[2] F.C. Xavier, O Consolador, pelo Espírito Emmanuel, Editora FEB, 29ª Edição, Brasília (2015)
[4] A. Kardec, O Livro dos Médiuns, Editora FEB, 81ª Edição, Brasília (2013).
[5] idem.
[6] A. Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, Editora FEB, 131ª Edição, Brasília (2013).
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domingo, 15 de maio de 2016

Debate: A Livraria Espírita deve ter somente livros Espíritas?


Créditos da imagem: www.ipeak.com.br



Hoje em dia não se vê mais publicações abertas que contenham ataques e refutações diretas contra o Espiritismo, ou se elas existem, pelo menos não chegam a ter o nível de circulação e divulgação que talvez tenham tido outrora. 

Entretanto, há uma certa discussão sobre a questão de se admitir livros não Espíritas em livrarias Espíritas. De um lado, existe a questão de se disponibilizar tudo e as pessoas que comprarem, que comparem e vejam o que é condizente com a Doutrina, e o que lhes pode proporcionar um crescimento, um aprendizado útil, etc. De outro, existe o argumento de que elas só devem fornecer livros condizentes com o Espiritismo, que não contenham erros doutrinários, a fim de que alguém que não conhece do assunto ou ainda não esteja em condições de avaliar o conteúdo ache que aquilo, que foge aos princípios e mesmo contradiz a doutrina, é Espiritismo.


Ao lado do primeiro, tem-se o fato de expor de tudo e permitir a livre análise por parte das pessoas. Já em relação ao segundo, a questão de nem todos serem criteriosos ou ter estudado o suficiente para separar o que é do que não é Doutrina Espírita, o que faz sentido do que não faz.

De todo modo, o que ressalta é a necessidade do estudo, para evitar aceitar-se qualquer coisa e divulgar um erro como se verdade fosse. Não há orador nem escritor que não possa e não deva ser avaliado em suas palestras ou em seus escritos.

E vocês, o que acham?
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terça-feira, 10 de maio de 2016

Explicações simples: Obsessão e espécies

 





Obsessão: gênero que comporta algumas espécies. É o domínio que alguns Espíritos conseguem adquirir sobre certas pessoas, conforme O Livro dos Médiuns.


Obsessão simples: o médium sabe que está sendo enganado, e o Espírito não tenta se esconder. Seu único inconveniente é o de atrapalhar que se receba comunicações de bons Espíritos ou amigos.

Fascinação: o Espírito finge ser virtuoso, podendo até falar em caridade e humildade, por exemplo. Além disso, o médium não acredita que está sendo enganado, podendo propor as coisas mais absurdas, e não perceber que o são. O obsessor não quer que seja feita análise do que fala e diz, e tenta fazer com que o fascinado se afaste dos que podem lhe aconselhar e indicar os erros.

Subjugação: A vontade do que a sofre é paralisada, e ele não quer fazer determinadas coisas mas se sente forçado a tal. A subjugação pode ser moral, na qual o subjugado toma resoluções sem cabimento, parecido com a fascinação (exemplo: abandonar sua casa em perfeito estado e harmonia, ir morar na rua), e/ou física, na qual há uma atuação sobre os órgãos materiais, levando a movimentos involuntários (exemplo: ajoelhar-se em praça pública, sem nenhuma razão).
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Conceitos básicos: Subjugação

Subjugação: espécie na qual vontade do que a sofre é paralisada, e ele não quer fazer determinadas coisas mas se sente forçado a tal. A subjugação pode ser moral, na qual o subjugado toma resoluções sem cabimento, parecido com a fascinação (exemplo: abandonar sua casa em perfeito estado e harmonia, ir morar na rua), e/ou física, na qual há uma atuação sobre os órgãos materiais, levando a movimentos involuntários (exemplo: ajoelhar-se em praça pública, sem nenhuma razão).
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Explicação simples: Fascinação

Fascinação: espécie de obsessão na qual o Espírito finge ser virtuoso, podendo até falar em caridade e humildade, por exemplo. Além disso, o médium não acredita que está sendo enganado, podendo propor as coisas mais absurdas, e não perceber que o são. O obsessor não quer que seja feita análise do que fala e diz, e tenta fazer com que o fascinado se afaste dos que podem lhe aconselhar e indicar os erros.
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Explicação simples: Obsessão simples

Obsessão simples: espécie na qual o médium sabe que está sendo enganado, e o Espírito não tenta se esconder. Seu único inconveniente é o de atrapalhar que se receba comunicações de bons Espíritos ou amigos.
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Explicação simples: Obsessão (gênero)

Obsessão: gênero que comporta algumas espécies. É o domínio que alguns Espíritos conseguem adquirir sobre certas pessoas, conforme O Livro dos Médiuns.

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terça-feira, 3 de maio de 2016

Indicação de Livro: O Espírito e o Tempo - J. Herculano Pires

       
       
         "Uau, que livro!" Essa foi uma frase que passou pela minha cabeça logo depois de terminá-lo.


        Para quem gosta e quer pensar o Espiritismo (enquanto lei da natureza), com uma visão ampla, histórica e crítica do desenvolvimento do homem até chegar nos dias atuais, alertando para os erros que se cometem e os resquícios da antiguidade ainda presentes nos cultos atuais, bem como o que isso tudo tem a ver com a doutrina, e muito, muito mais, essa obra é essencial.

       Iniciando pela divisão dos momentos históricos em horizontes, desde a civilização selvagem (horizonte primitivo) até aquele que ainda iremos alcançar (horizonte espiritual), passando pelo que vivemos (horizonte civilizado), José Herculano Pires narra movimentos desde os primórdios humanos, com manifestações mediúnicas tendo acontecido em todos os tempos, e que os cultos sugiram de fatos naturais, e não o contrário.

       Depois, após explicar o por que da necessidade do formalismo em determinado momento, ressalta a importância de cada fase, e a necessidade de "retorno ao natural", ou seja, a naturalidade dos fenômenos como acontecia na época das tribos, claro que sem dispensar as conquistas adquiridas, conforme o seguinte trecho:



"Partindo do natural, os homens construíram na Terra o seu mundo próprio, artificial. O desenvolvimento da inteligência humana, cuja característica é o pensamento produtivo, tinha forçosamente de levar os homens pelos caminhos da abstração mental, e consequentemente do formalismo. (...) Mas a finalidade do convencionalismo, e consequentemente do formalismo, não é distanciar o homem da natureza, e sim facilitar a sua adaptação a ela. Por isso, mais hoje, mais amanhã, o homem teria de voltar ao natural, destruindo pouco a pouco os excessos de convencionalismo, os exageros perniciosos do seu artificialismo."



        Além disso, o autor critica o movimento espírita em diversos pontos, como, por exemplo, no que se refere à parte pedagógica, quando diz que "(...) os congressos e simpósios educacionais espíritas revelam o quase total alheamento, dos professores espíritas, pelo desenvolvimento da Pedagogia Espírita, sem a qual só haverá escolas comuns com o rótulo formal de espíritas" e mais a frente, ao declarar que "A escola espírita só pode corresponder a esse nome se representar o novo tipo de educação determinado pelos princípios espíritas.". Também o faz no tocante à Cultura Espírita, conforme o seguinte trecho:



"Foi gigantesco o esforço do famoso Druida da Lorena (...) para mostrar que o Espiritismo era uma nova concepção do homem e da vida, que não se podia confundir com as escolas espiritualistas ancestrais, carregadas de superstições e princípios individualmente afirmados ou provindos de tradições longínquas, sem nenhuma base de critério científico. O mesmo acontece hoje entre nós, sob a complacência de instituições representativas da doutrina e o apoio fanático de líderes carismáticos, piegas espirituais e alucinados mentais a dirigir multidões de cegos."



        E ainda comenta nas linhas seguintes o que acontece quando se tenta corrigir essa situação, afirmando que tais tentativas "se chocam com a frieza irresponsável dos que se dizem responsáveis pelo desenvolvimento doutrinário", o que serve de alerta para o movimento espírita, posto que mesmo tendo sido escrita décadas atrás, uma vez vinda do "homem múltiplo", conforme o chamou Jorge Rizzini, e que possui o currículo que possui, tal comentário merece atenção.

    Em resumo, a obra merece não ser somente lida como estudada por todos os que querem conhecer o por que de certos costumes religiosos, a evolução do Espírito no tempo e, para quem está disposto a refletir, pensar fora do usual e, quem sabe, ter uma direção (jamais absoluta, ou única) na postura a ser tomada pelo Espírita frente ao que ver e ouvir no movimento.

         Por fim, um trecho altamente significativo, extraído do último capítulo do livro, que convida a uma reflexão:


"O medo do pecado que sai da boca, da pena ou das teclas (...) faz desaparecer do meio espírita o diálogo do passado recente, substituindo o coro dos debates pelo silêncio místicos das bocas-de-siri. Ninguém fala para não pecar e peca por não falar, por não espantar pelo menos com um grito as aves daninhas e agoureiras que destroem a seara." 

Abraço a todos!

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